Impermanência, por Ana Carolina Pan

*Texto enviado no dia 17 de maio de 2024.

É difícil acompanhar de longe a enchente. 

Algumas fotografias são tão lindas, tão silenciosas, que jamais contarão a tristeza, o choro, o abandono, o frio, o próprio ruído da água para quem não ouviu. 

Os vídeos são inacreditáveis, só que são reais. Carros em pé, amontoados, lama por todos os lados e em tudo, pessoas acampadas, cozinhando, dividindo os suprimentos recebidos, indo de barco ajudar outros que estão ilhados, sem maneira de sair de casa. 

O que não tem nem como imaginar? O cheiro. 

Não consigo dimensionar o cheiro da água de enchente acumulada durante dias. Queria reconhecer lugares que frequentei. 

Como estão minha amada Oswaldo e Ramiro Barcellos? Como está o prédio que trabalhei que ficava dentro do Cais do Porto? Aposto que nem existe mais há tempos. 

Quando eu voltar e revisitar esses lugares a mudança será profunda. E me pergunto quanto de mim ainda existe ali. 

Queria que Saramago escrevesse sobre nós.

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